sábado, 17 de março de 2012

Cultura académica: retrato de José Joaquín de Léon y Herrera (1712-1786), aluno, lente e reitor do Colégio Mayor de Nuestra Señora del Rosario. O retratado foi ainda cónego magistral da catedral de Santa Fé.
Representado de pé, com luvas brancas e cabeça coberta por solideo. Traja loba talar de dois corpos, sendo bem pronunciada a cava para a saída dos braços (a sobreveste não tinha carcela, vestindo-se e despindo-se pelo rasgo da cabeça/pescoço, daí o nome de "loba çarrada", distinto da variante "loba aberta"). As mangas da sotaina são estreitas e rematam com punhos ornamentados. Não se consegue perceber com inteireza se estes punhos são bordados no canhão ou se são encaixes de renda como acontece nas bocamangas das batinas dos bispos e togas judiciárias espanholas. Volta branca subida. Beca branca, com o símbolo do colégio lançada em V sobre os ombros,  com pontas a cair até meio da perna. Na mesa próxima, barrete doutoral armado em estrutura cartonada forrada de tecido negro, com os convencionais 4 picos ou cornos, sem cristas. No centro da copa foi afixada farta borla de franjados de seda lisa, em azul e branco (Filosofia e Teologia). Fixa a laurea uma pega central alta e bolbosa, ornada de passamanaria, que parece ser dourada como era usança no barrete doutoral da Universidad de Zaragoza.
Os colégios espanhóis eram seminários católicos, cujo distintivo comum era a beca. Na língua castelhana, beca significava uma faixa de pano ou estola longa que se assentava em V sobre o peito e ombros, lançadas as longas pontas pelas costas. Na atualidade a beca é usada pelos membros das tunas académicas (desde a década de 1950, com pontas curtas). Em certas universidades foi adotada como insígnia dos licenciados e mestres, solução que contraria a legislação espanhola que regulamenta o assunto (traje: toga preta espanhola+muceta+barrete sextavado com borla pequena ou pompom). Consta que foi a Complutense a lançar mão da beca quando organizou a cerimónia de formatura da infanta D. Cristina. Beca significa ainda bolsa de estudo. Em português, beca é tradicionalmente a veste profissional dos juizes, cujo sinónimo era garnarcha. Houve seminários católicos estabelecidos em Portugal onde a beca vermelha foi usada sobre a batina romana. Foi o caso do Seminário de Viseu. Em Lisboa, no Colégio dos Inglesinhos, os seminaristas usaram dois tipos de ornatos de ombros em tecido vermelho: a beca de pontas, idêntica à espanhola e à beca de alguns colégios da Universidade de Coimbra extintos em 1834-1836; o epitógio, com roseta e duas pontas caídas, à francesa, que se fixava no ombro esquerdo sobre a chamarra (os inglesinhos usaram pelo menos até 1907 sobre a batina ordinária uma chamarra aberta na frente, sem mangas, semelhante à veste clássica dos estudantes de Coimbra), distintivo que em Lisboa e no Porto era imitado por advogados. Uma caprichada toga de advogado, em bom estilo de confecção portuense, metia pano de seda, jogo de rosetas peitorais, canhões de cetim presos com alamares e epitógio "comme les inglesinhos".
Fonte: aula magna do colégio, http://urartegrupo1.wordpress.com/

2 Comentários:

Blogger Eduardo disse...

A propósito de "beca" com o significado de "bolsa de estudo".

Há quem tenha querido fazer remontar o vocábulo "beca" ao iídiche ou hebraico "beccan" - "subsídio".

Do estudo que fiz sobre os colégios em Espanha, esta solução é altamente improvável, para não dizer impossível. Os "colegiales" eram obrigados a fazer prova de "pureza de sangue" para serem admitidos. Face ao anti-semitismo grassante sobretudo a partir do édito de expulsão dos judeus, torna-se difícil aceitar que se tenha adoptado um termo de origem hebraica em estabelecimentos altamente elitistas como eram os colégios.

Facto é que, além da tutoria e preparação para admissão nos estudos gerais, os colégios ofereciam uma bolsa de estudo - em particular aos filhos da baixa nobreza rural "arruinada", passando a ser-lhe dada aquela conotação.

Cordialmente,

Eduardo Coelho

10 de abril de 2012 às 16:10  
Blogger Virtual Memories disse...

Caro Eduardo
Obrigado pelo comment. Sabe, a polissemia dos vocábulos e a propensão para teorizar na cabeça do alfinete tem alimentado estulticias. Por exemplo, nas infindáveis interrogações teóricas sobre um pão doce açoriano conhecido por "massa cevada", ele há os que dizem que é sim senhor é cevada, ele há os que dizem que não é cevada pois a farinha é de trigo, ele há os que querem que seja sovada pois que o amassar no alguidar era dar uma sova com os punhos.
Conclusão, esse pão é doce e é um regalo.
AMNunes

13 de abril de 2012 às 15:27  

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