segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

A farda dos vereadores, presidentes e empregados da Câmara de Lisboa (1855-1910)

Atendendo ao que me apresentou a câmara municipal de Lisboa, acerca da conveniência de novamente se estabelecer, em harmonia com os costumes da época, o uniforme de que, de ora avante, devam usar os vereadores, e os empregados da mesma câmara: hei por bem, em nome d'El-Rei, decretar o seguinte:
Artigo 1.º: É estabelecido um fardamento para uso dos vereadores da câmara municipal de Lisboa, e bem assim outro para o escrivão e oficiais da respetiva secretaria, para o tesoureiro do concelho, e para o guarda-mor da câmara, sendo regulado o uniforme destes empregados pelas graduações de cada um deles.
Artigo 2.º: O fardamento dos vereadores da câmara municipal será conforme à designação que se segue:
1.º farda direita de pano azul ferrete, com uma só ordem de oito botões de metal branco, com as armas da câmara; devendo a gola, os canhões, as portinholas, e o espaço entre elas compreendido, ser tudo bordado com um silvado de ramos de carvalho.
2.º Calça do mesmo pano, com lista de galão de largura ordinária, nas costuras dos dois lados.
3.º Colete branco de corte direito, com quatro botões correspondentes aos da farda.
4.º Chapéu armado de plumas brancas, com presilha e laço nacional. Gravata e luva branca.
5.º Florete com bainha preta. Para a cintura faixa de seda de três listas iguais, a do centro branca, e as outras azuis ferretes, com borlas das mesmas cores, sendo de prata a parte branca.
Único: As bordaduras da farda, o galão da calça, a presilha do chapéu, e as gurnições do florete serão de prata; devendo todo o fardamento, nas suas diversas partes, ser igual ao padrão dos modelos, que baixam com este decreto, rubricados pelo ministro e secretário de Estado dos Negócios do Reino.
Artigo 3.º: Os modelos para o uniforme dos empregados mencionados no artigo 1.º serão pela câmara municipal submetidos à aprovação do governo.
O mesmo ministro e secretário de Estado assim o tenha entendido, e faça executar. Paço de Sintra, em 25 de julho de 1855. Rei Regente [D. Fernando]. Rodrigo da Fonseca Magalhães.
Decreto de 25.7.1855, publicado do Diário do Governo n.º 183, de 6.8.1855
ANOTAÇÕES
1-Eis um exemplo consumado de um mau diploma que ao arrepio de toda a boa tradição municipalista portuguesa inventa uma farda napoleónica, vestindo os vereadores e funcionários do município de Lisboa de soldadinhos de chumbo.
2-O diploma saiu incompleto. Não apresentou o modelo do uniforme destinado aos funcionários e, numa lógica centralista, exigiu que a câmara o fizesse submeter à aprovação do governo (entenda-se Ministério do Reino).
3-O uniforme adoptado em 1855 vinha instaurar artificialmente distinções entre os membros da corporação municipal através dos motivos bordados, impondo à cultura municipal tradições do foro militar.
4-O chapéu referenciado é o bicórnio ou napoleão.
5-A gravata é o lacinho branco de seda ou papillon.
6-Ao contrário dos municípios italianos e franceses, os municípios portugueses deixaram de usar em 1910 as faixas, o que é bem pena pois servem lindamente as tradições protocolares republicanas.
7-O Decreto de 25.5.1882 fixou um uniforme para os vereadores da câmara municipal do Porto, cujo texto ainda não conseguimos localizar. Seria idêntico ao aprovado para Lisboa em 1855?
8-O Decreto de 28.7.1882 fixou para todas as corporações municipais, exceto as de Lisboa e do Porto, uma farda à base de cartola, casaca e faixa.
9-Na atualidade não conhecemos nenhum município português que tenha mantido as fardas referidas, nem o antigo traje de capa e espada à portuguesa. O município do Funchal tem usado nos últimos dez anos uma capa preta bandeada de branco, grande colar e vara. Trata-se de um traje baseado no antigo traje de vereador de que há fotografias, gravuras e até exemplares preservados no Arquivo Histórico Municipal de Coimbra. Nas câmaras de Lisboa e do Porto temos notícia de um grande colar em contextos de gala.

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