sábado, 24 de julho de 2010


Alunos da Escola Médico-Cirúrgica de Lisboa num intervalo de aulas, 1911

Pátio da nova Escola Médica, inaugurada em 1906. A revista I. P, n.º 294, de 9 de Outubro de 1911, dedicou uma reportagem à vida escolar na Escola Médica de Lisboa. Das sete fotografias relativas aos estudantes em aulas teóricas, intervalos e prática laboratorial, o único traje não civil que se avista é a bata branca.

A situação retratada leva-nos a concluir que a presença da capa e batina nesta Escola era bastante rarefeita, estando mais directamente correlacionada com os membros da Tuna Académica de Lisboa. A confirmar esta ilação, a fotografia do curso médico de 1905, onde avultam duas formandas, não regista qualquer capa e batina, como não regista crachás de curso nem pastas com fitas (cf. Maria Filomena Mónica - A queda da monarquia. Portugal na viragem do século. Lisboa: Dom Quixote, 1987, pp. 234-235).

Não é porém esta a imagem da Faculdade de Medicina da UL veiculada pelo mediático filme A Canção de Lisboa, do arquitecto Cottineli Telmo (1933), película que procura replicar o modus vivendi que se praticava com outro nível de radicação etnográfica em Coimbra.

Algum uso da capa e batina se nota na UL ao longo da Primeira República, mas associado aos estudantes da Faculdade de Direito pelos finais da Grande Guerra e década de 1920 adentro. Pelo menos é o que parecem mostrar fotografias do curso de Marcello Caetano, quando a casa era no Campo de Santana (Marcello Caetano - Fotobiografias do século XX. Lisboa: Círculo de Leitores, 2002, pp. 20, 27, 28). Aliás é neste núcleo de estudantes católicos e de adeptos do Integralismo Lusitano que arranca em Portugal a Missa de Consagração dos Quintanistas, mais conhecida por "benção das pastas" cuja origem se tem por erradamente conimbricense. Os dados disponíveis são de molde a não permitir equívocos. A benção das pastas arranca na UL em 1926, enquanto a Consagração dos Quintanistas Católicos da UC ao Sagrado Coração de Jesus tem a sua primeira edição em Maio de 1932. Por seu turno, os estudantes da UP realizam a sua primeira benção de pastas em 1944, na fase de transição da antiga Festa da Pasta para o modelo Queima das Fitas.

O uso da capa e batina entre os estudantes da UL durante a República e o regime salazarista não está convenientemente estudado. Por exemplo, não se sabe se as alunas da UL chegaram a usar o conjunto tailleur/capa inventado em 1915 pelas suas colegas dos liceus da capital.

Destoando do registo empático assumido no filme a Canção de Lisboa, a Mocidade Portuguesa começou por se mostar muito desconfiada em relação à capa e batina e às vivências estudantis. A título de exemplo, o Jornal da Mocidade Portuguesa, do n.º 1, de 1/12/1937 ao n.º 7, de 2/03/1938 depreciou o assunto através da banda desenhada morigeratória "As aventuras do caspa e batina".

Ao contrário da Cidade Universitária de Coimbra, onde a representação artística da capa e batina é forte, na Cidade Universitária de Lisboa a capa e batina é exteriormente imperceptível. Imperceptível porque não fazia parte da identidade estudantil ou impercetível porque os estudantes não foram sequer motivo de representação artística? Vejamos, a fachada da Aula Magna, nas traseiras da reitoria, está generosamente guarnecida de esgrafitados onde Almada Negreiros evoca a mitologia clássica e representa bandos de estudantes em diversas actividades. Nem um veste capa e batina, ou como se diria em Coimbra, estão todos "à futrica".

Embora não pareça, este é um assunto do maior interesse para as Ciências da Educação, para a sociologia da educação e estudo dos comportamentos juvenis. Que continuidades e rupturas entre um uso anterior a 1974 marcadamente rarefeito e masculinizado e os uso massificados que nas décadas de 1980-1990 foi dado avistar em Lisboa?

1 Comentários:

Blogger Unknown disse...

Olá! Fantástico post! Por acaso não tem, em formato digital, mais fotografias da reportagem? Ou mesmo a reportagem toda? Muito obrigado.

7 de agosto de 2010 às 16:48  

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