quarta-feira, 2 de junho de 2010


Retrato de um seminarista espanhol
Fotografia de inícios do século XX, documenta a extinta loba dos universitários espanhóis que se usou em Salamanca e noutras instituições de ensino superior até ca. 1834. O registo atesta uma veste talar de dois corpos sobrepostos, a sotaina interna e o o manto externo. A sobreveste é despojada de mangas, comportando duas aberturas para a saída dos braços, como acontecia com a loba dos académicos de Coimbra e com as antigas vestiduras dos juristas. Ao contrário dos hábitos e togas de carcela dianteira, as lobas eram vestes cónicas de enfiar pela cabeça.
Dois outros adereços característicos deste conjunto indumentário são o barrete de quatro picos ou arestas e a beca peitoral cujas pontas desciam quase até meio da barriga da perna. A beca dos seminaristas era vermelha, aproximada ao sangue de boi. Adereço semelhante foi usado em seminários católicos portugueses (caso de Viseu) e em pelo menos dois colégios agregados à Universidade de Coimbra.
Nas universidades espanholas dos nossos dias, os tunos usam uma beca curtinha com o emblema da instituição a que pertencem. Elevada percentagem de universidades generalizou a imposição desta banda nos actos de formatura de licenciados. Porém, a adaptação não é inteiramente pacífica, uma vez que a imposição da beca era um rito de entrada na vida colegial e universitária e não um rito de passagem ou de saída. O facto de este distintivo estar banalizado pelas tunas académicas e pelas confrarias gastronómicas parece não ajudar a convencer os mais cépticos.
Esta variante da loba universitária, caída em desuso na Europa continental, ainda aparece em actos solenes realizados na Universidade de Oxford. Em fotografias disponíveis para 2005-2007 pudemos confirmar a sotaina preta de seda, com mangões tubulares fendidos, à século XVI, e o manto em seda carmim.
Do ponto de vista da arqueologia vestimentária, a extrema rarefacção destas peças e a escassez de registos iconográficos leva a que os poucos investigadores interessados na história da indumentária acreditem que as lobas eram batinas talares romanas ou simples túnicas. Contudo, trata-se de um conhecimento técnico especializado que passa por campos como os padrões texteis utilizados e as técnicas de confecção, necessárias a museus do traje, guarda-roupa de teatros e filmes, encenação de cortejos históricos, dramatizações escolares e museus académicos e de arte sacra. Aliás, uma das maiores lacunas dos museus de arte sacra ocidentais reside na valorização da paramentaria litúrgica em detrimento da indumentária eclesiástica. Passados 40 anos sobre a reforma da indumentária eclesiástica autorizada pelo Papa Paulo VI (1969), há vestes, calçado, coberturas de cabeça, abafos e insígnias definitivamente perdidos.
Perderam-se as peças, perdeu-se a técnica de confecção, perdeu-se a arte de passamanaria associada, perderam-se as variantes regionais que os modelos romanos nunca tinham extirpado. Na Universidade de Coimbra, a história dos hábitos e insígnias é decepcionamente desertificadora, marcada pelo desleixo, pelo abolicionismo e pela ausência de consciência patrimonializadora.

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