quinta-feira, 17 de junho de 2010

Tabarro, capote, capa española


Camponês alentejano com traje de festa e capote
Postal ilustrado, captado entre 1900-1910 em local não identificado. Modelo de configuração urbana europeia.
Fonte: Postais da colecção Trajes antigos do Alentejo, http://www.traje-antigo-alentejo.blogspot.com/.
Cronologicamente anterior ao capotão de romeira dupla que se implantou no Alentejo e no Algarve no decurso de oitocentos, este modelo remonta pelo menos aos séculos XVII-XVIII, tendo sido usado nas principais cidades de Itália, França, Espanha, Portugal, Inglaterra e EUA. A partir da cidade passou a ser reproduzido pelos alfaites implantados nos meios rurais. Também se podia adquirir em feiras e nas deslocações às cidades. O dicionarista Rafaeal Bluteau descreve-o em pormenor, dizendo que a toda a volta do colarinho tinha pregado um bioco ou capelo aberto que se deitava sobre a cabeça nas cerimónias de luto pesado. Também é referido nos antigos estatutos da Universidade de Coimbra, nos artigos que proibem o porte de mantéus com capelos cerrados, não porque fossem incómodos mas para evitar a ocultação do rosto em actos criminalizados pelas ordenações.
Abafo civil, abado militar, abafo clerical, abafo unissexo, em tons de castanho forte, preto e azul-ferrete, em lã ou noutro tecido de melhor estirpe, com e sem debruns, metendo veludilhos e peles, alamares de tecido e em prata, colarinho raso, gola de orelhinhas e golão a descair, eis o retrato de uma veste que os estudantes dos politécnicos de Beja, Portalegre e Bragança dão sinais de recuperar e valorizar. Os usos não se quedam por aqui, pois este capote andou associado ao traje de equitação e foi o agasalho nobre dos estudantes da antiga Escola Agrária de Coimbra. O Papa Bento XVI continua a usar o seu, nos invernos, na tradicional cor vermelha.
No tecido provincial português, notícias há da ampla radicação desta veste, passando pelo Algarve, Alentejo, Lisboa, Beiras, Trás-os-Montes e Açores.
Do capote deixaram registo:
-Jorge Dias - Rio de Onor. Comunitarismo agro-pastoril. 3.ª edição. Lisboa: Editorial Presença, 1984 (1.ª versão de 1953). Fotografia do capote, já em escalada de rarefação, referenciado como prestigiado traje de noivo, invernia, casamentos, funerais, festividades;
-António Augusto da Rocha Peixoto - Etnografia Portuguesa. Obra etnográfica completa. Lisboa: Publicações Dom Quixote, 1990. Os estudos sobre o Traje Serrano (=transmontano) vieram publicados em 1907 na revista "Portugalia". As fotografias inclusas documentam a croça de palha (Gralheira; Marão), o capote de romeira e gola (Abas de Nogueira, Rebordãos), e a capa de honras (Miranda);
-João Afonso - O trajo nos Açores. Angra do Heroísmo: Secretaria Regional dos Assuntos Sociais, 1987. Fotografia relativa a mulheres da Ilha Terceira com farto capote, romeira muito comprida a lembrar a murça coral de cónegos catedralícios europeus, gola de veludo e um capelo em forma de travesseiro posto na cabeça (pergunta: em que medida o clero da Sé e os professores do Seminário angrense poderão ter influenciado este modelo?);
-Madalena Brás Teixeira (coordenação) - O traje do Algarve. Orla marítima. Lisboa: Museu Nacional do Traje, 2001. Gravuras, desenhos, fotografias e esquemas reconstitutivos relativos a Lisboa e ao Algarve. Presença do capote com bioco tromba de elefante e bioco aliviado, particularmente em situações de luto.

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