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quinta-feira, 24 de dezembro de 2009


Borla doutoral de Bernardino Machado
MBM

Património vestmentário e insigniário conimbricense (cont.)
O conjunto insigniário legado por Bernardino Machado

As Insígnias Doutorais

As insígnias doutorais de modelo conimbricense são constituídas por uma cobertura de ombros (capelo), uma cobertura de cabeça (o barrete de borlas ou borla) e um anel de ouro com pedra na cor da especialidade científica.
Trata-se de um conjunto artesanal, de grande aparato, originário da UC, que tendo herdado elementos dos séculos XVI e XVIII se fixou estavelmente na segunda metade do século XVIII com base em ornatos rocaille.
O modelo de insígnias doutorais é comum a todas as Faculdades da UC. O azul-escuro é a cor oficial herdada da antiga Faculdade de Artes Liberais, que fora adoptada pela Faculdade de Philosophia Natural, instituição resultante da Reforma Pombalina (1772-1911).
Não se conhece nos países ocidentais insígnias de confecção artesanal igualáveis a este modelo, o que permite colocar o conjunto conimbricense em situação de paridade com criações singulares como o “traje de luces” dos bandarilheiros (Espanha), o galero de borlas dos cardeais romanos, a tiara papal, o capelo de gala dos cónegos capitulares portugueses, as insígnias bizantinas dos patriarcas ortodoxos, os chapéus de gala dos imperadores chineses, ou vestes populares portuguesas de grande aparato como o chapéu feminino de Ovar/Murtosa, o capote e capelo dos Açores, a capa de honras de Miranda do Douro, o capote alentejano ou ou gabão da Beira Litoral.

O Capelo: na gíria dos lentes e estudantes da UC designa-se por capelo uma dupla capinha de ombros, munida de alamares e capuz, confeccionada artesanalmente em tecidos luxuosos de veludo e cetim, com ornatos bordados a fio de seda natural. O veludo e o cetim são exclusivos das insígnias dos detentores do grau de doutor, ficando a seda reservada aos graus de licenciado e de bacharel.
O capelo remonta à Idade Média. Na sua versão de luxo foi usado por altos dignitários da Igreja Católica (murça, mozetta, muceta, hood), doutores universitários, reitores, jurisconsultos e aristocratas, em veludo, veludo e cetim e arminhos. É uma insígnia comum à maior parte das universidades clássicas ocidentais, havendo notícia de ter sido usada em Itália, Portugal, Áustria, Polónia, Alemanha, Espanha, França e Grã-Bretanha.
A versão à base de arminhos, inteiriça ou fendida sobre o peito, ainda é usada pelos juízes dos tribunais superiores da Grã-Bretanha, Austrália, Escócia e Canadá, Presidente da Cour de Cassation de França, alguns cardeais romanos, reitores de universidades italianas e polacas e vice-reitores de Cambridge.
A variante em tecidos ricos, na cor oficial das especialidades académicas, ocorre em Coimbra, Espanha, universidades brasileiras e da América Latina e na maior parte das universidades anglo-saxónicas seguidoras dos paradigmas de Cambridge e Oxford.
Em Coimbra, o capelo era uma insígnia de grande gala própria dos que tomavam graus de bacharel, licenciado e mestre/doutor. Apenas chegou ao presente o capelo doutoral cujas características nucleares radicam na existência de dupla romeira, na dupla abotoadura frontal à base de gancheta e aselha, no emprego de tecidos de veludo e cetim, na presença do capuz dorsal e na passamanaria peitoral rocaille.
O talhe, corte e cosimento dos dois panos do capelo é trabalho de costureira. A confecção dos ornatos é obra de bordadeira. Não se trata de um bordado tradicional a fio de seda, fio de ouro ou fio de prata, como acontece nas casacas de toureiro, casacas do grande uniforme de diplomata, militar ou dos membro de academias científico-literárias, nem da solução empregue nas colchas de Castelo Branco.
Na maioria dos exemplos acima enunciados, a bordadeira decalca um desenho sobre o tecido, monta o pano de linho, seda ou cetim num bastidor e executa o bordado, originando uma ornamentação final relativamente plana. No caso específico das casacas de toureiro português, desde a década de 1990 que as casacas de cetim são bordadas em máquinas programadas por computador.
Também não se trata de coser um fio plano sobre o peito do capelo, podendo conferir-lhe um desenho artístico, como acontecia com os capelos doutorais da Universidade de Sevilha. Nas insígnias conimbricenses a ornamentação é totalmente autónoma em relação aos tecidos do capelo.
Trata-se de decalcar e cortar cartolina ou entretela, com formatos de folhas de louro, folhas de oliveira, losangos, círculos, tiras rectangulares e molduras à base de lóbulos, matéria-prima que é revestida a fio de seda.
Os pontos são tradicionais, omitindo-se os de cadeia, pé-de-flor e nó. As folhas, corolas e molduras ou mandorlas são preenchidas a ponto cheio, rematando na orla exterior com um caseado ou ponto de remate de belo efeito. Nalguns exemplares mais antigos o ponto de remate era realizado com fio laminado tingido na cor da especialidade científica, o que conferia ao trabalho final um aspecto retesado. É uma espécie de “richelieu” muito empregue em toalhas de enxoval, cortinados de linho, toalhas de festa e de altar de igreja, embora o “richelieu” tenha uma superfície mais arredondada, enquanto o trabalho conimbricense é espalmado.
As tirinhas destinadas a armar as flores e pétalas são simples de forrar. Como são armadas na vertical e por camadas, criam um espectacular efeito visual de relevo. Uma vez concluídas as diferentes peças, são estas unidas umas às outras e cosidas à superfície do capelo em cachos horizontais. Trabalho ornamental próximo do descrito era usado na confecção dos capelos dos cónegos capitulares portugueses e nas jaquetas e calções dos bandarilheiros.
Ao contrário do que era habitual em Coimbra, o capelo doutoral de Bernardino Machado apresenta a romeira interna em cetim e a externa em veludo[1]. É de confecção inteiramente artesanal, em azul régio, com o forro em cetim, o capuz em veludo e as restantes partes em veludo, excepto os alamares e os cachinhos de pingentes. O capuz é pouco pronunciado, quando comparado com os modelos académicos de Espanha, Oxford, Cambridge e capelos dos cónegos capitulares portugueses. Em versões mais recuadas era mais longo, permitindo trazê-lo deitado pela cabeça em situações de luto, leitura de lições na cátedra e de porte do barrete.
Sobre os ombros e peito assenta a romeira de baixo, fendida na zona do externo, que na sua versão primitiva abotoava com carcela e botõezinhos forrados. A romeira interna comporta três alamares de cada lado, alinhados horizontalmente, e três aselhas e respectivas ganchetas. Tradicionalmente apenas se abotoam as aselhas internas, deixando as três exteriores soltas.
A primeira peça do alamar é uma moldura ou mandorla que consiste numa entretela trilobada revestida de fio de seda a ponto cheio, levando orla em ponto de remate, com funções de sépala floral ou de cesta. Estas sépalas florais correspondem aos medalhões presentes em frescos pintados nos tectos de igrejas dos séculos XVII e XVIII, em painéis de azulejos e motivos ornamentais reproduzidos nos centros das colchas de Castelo Branco.
Partindo do eixo de simetria do capelo para a periferia, sobre o rebordo da sépala fixam-se as seguintes peças confeccionadas separadamente:

-à direita, a gancheta, confeccionada com quatro filaças, duas passivas e duas externas, na técnica da gacheta de nós direitos, aplicando-se sobre o rebordo um botão esférico de madeira forrado a fio, ponto de pesca e florinha losangular aberta. Este botão é, para todos os efeitos, uma romã miniaturizada com a sua coroa superior. No capelo de Bernardino Machado, só a murça externa é que ostenta os botões, exibindo a interna ganchetas recurvadas em fio metálico;
-do lado esquerdo, a aselha, igual à gancheta, mas sem o botão;
-uma rosinha solta, com corola losangular e oito pétalas abertas;
-uma rosa grande, assente num galão de dezassete espirais. Este ornato tanto pode representar o rebordo de uma cesta de vimes como a imitação da vagem torsa da tremoceira, sobre o qual se aplicam duas camadas de pétalas abertas em relevo, cada uma com dez pétalas forradas, e por cima, a corola redonda. As corolas das florinhas são em geral losangulares, e as das rosas grandes circulares, revestidas a fio de seda com uma técnica semelhante à usada nas colchas de Castelo Branco. O galão espiralado não era usado por todas as artesãs locais, havendo capelos onde este ornato aparece substituído por uma “grega” ondulada, semelhante às rosinhas confeccionadas pelas bordadeiras de croché da Ilha Pico. Esta variante foi assinalada em alguns capelos, servindo de exemplo os de José Alberto dos Reis[2] e D. Manuel Gonçalves Cerejeira;
-o meio da sépala é preenchido com uma rosa oblonga, de corola em losango, doze pétalas, e quatro folhas dispostas em duas camadas. A camada inferior é mais comprida e larga. Estas folhas são vazadas no meio e parecem remeter para a simbologia clássica da folha da oliveira. Contudo, artesãs havia que substituíam as quatro folhas referidas por duas espiraladas, como documentam registos dos capelos de João Porto, Guilherme Braga da Cruz e Marcello Caetano[3] (Fac. Direito da Univ. de Lisboa);
-segue-se outra rosa grande;
-na orla da sépala aplica-se mais uma florinha idêntica à que figura do lado da gancheta/ou aselha;
-junto à moldura cose-se uma terceira rosa grande, assente em penachinho circular de fiapos de seda, com duas camadas de pétalas abertas (10 em cada uma), corola circular e cascata de quatro fiadas de pingentes. Cada jogo de pingentes é constituído por um fio torso e quatro contas de madeira perfuradas e revestidas, sendo as superiores mais volumosas, com remate inferior em tufo. Estas contas representam bagos de uva, símbolo de alegria, eucaristia, celebração e prosperidade.
Nos modelos rocaille de maior efeito visual, os pingentes de bagos eram substituídos por fiadas de quatro florinhas campaniformes, conforme a gramática ornamental empregue em sapatos de luxo e franjas de mitras e estolas. No capelo de Bernardino Machado, a romeira interna contém vinte e quatro pingentes e a exterior outros vinte e quatro, perfazendo cento e vinte e quatro bolinhas perfuradas e forradas a fio e agulha.
Recapitulando, o capelo é ornamentado com doze alamares, seis ganchetas e seis aselhas, doze sépalas ou molduras, trinta e seis rosas grandes, doze rosas médias, trinta e seis rosinhas e doze jogos de fiadas de berloques ou doze jogos de pingentes de florinhas.
Estes cachinhos florais pendentes, ora em forma de florinhas, ora semelhando bagos, também ocorriam na jaqueta e calções do traje de luces dos bandarilheiros, no capelo de coro dos cónegos capitulares portugueses das catedrais de Coimbra e Angra do Heroísmo e na ornamentação de sapatos eclesiásticos, mitras, tiaras, faixas, reposteiros, dalmáticas, estolas, almofadas e panos funerários[4].
Por cima da romeira interna cose-se a romeira de fora, ou sobre-murça, aplicando-lhe nas abas peitorais o mesmo dispositivo ornamental à base de molduras, rosas, ganchetas, aselhas, penachinhos e pingentes ou cachos florais. A ornamentação completa de um capelo requer doze jogos de alamares.
Não se conhece nenhum documento que fundamente satisfatoriamente a existência da dupla romeira no capelo conimbricense. Apenas se conhecem duas situações semelhantes no Ocidente: o “fanon” privativo dos papas romanos, insígnia constituída por uma romeira de seda branca orlada e listada a ouro, usada em missas solenes, e em seda escarlate pelos antigos camaristas da Casa Papal; a antiga murça doutoral da Universidade de Sevilha, documentada em retratos a óleo até finais do século XIX, cuja ornamentação não chegou a atingir o esplendor rocaille da versão conimbricense.
De acordo com a simbologia barroca, a ornamentação do capelo significa a floração da sabedoria através das flores que o novo doutor oferece a Minerva no seu templo. De configuração cónica, o afunilamento superior do capelo marca a transição para a parte mais nobre do corpo onde resplandece a sabedoria, a cabeça.

A Borla
Barrete de confecção artesanal conimbricense, de estrutura cónica em cartão, revestido de cetim azul-escuro. Tem 19cm de diâmetro de base e 15cm na copa. A ilharga mede 13cm de altura, correspondendo 12 às franjas e 1 à laurea espiralada. Apresenta forma de cesta ou açafata de flores, de cujo centro emerge um caule bolboso florido, motivo bastante comum na azulejaria setecentista e nas albarradas das colchas de Castelo Branco. O cartão do barrete era cortado por um molde e afeiçoado pelas bordadeiras com o calor brando de uma vela acesa.
Sobre a copa assenta um fundo falso, circular, revestido de cetim, no qual se fixam a pega central, as rosas abertas, as folhinhas forradas a ponto cheio e a coroa de louros. A copa é ornamentada no mais puro estilo rocaille, num jogo de ocupação plena dos espaços, com seis rosas grandes, seis rosetas, seis meias rosas e seis folhas abertas em torno da base da pega.
As seis folhas, abertas e onduladas, são bordadas a ponto cheio, rematando em bico. Dispostas em torno do sopé da pega, em modo de polígono estrelado, orientam a restante ornamentação da copa: entre cada folha aplicam-se seis florinhas, com corola em losango e dupla camada de pétalas; junto ao bico de cada folha são alinhadas seis rosas grandes, iguais às da ornamentação peitoral; entre o rebordo de cada florinha e o galão espiralado há ainda lugar a seis outras flores, estas com duas folhas oblongas, seis petalazinhas e corola em formato de concha vieira.
A pega é um balaústre de madeira, entalhado em torno de marceneiro, revestido de passamanaria, usado pelo menos desde a segunda metade do século XVI. Elemento comum ocorria nos chapéus de verão e inverno dos imperadores da China, dos dignitários tibetanos e em chapelaria asiática e judaica dos séculos XV e XVI. No século XVIII, a pega, a um tempo ornamental e funcional, atinge a sua extensão máxima, como que a imitar os penachos dos capacetes e barretinas militares. A estrutura acompanha a gramática barroca avistada nos coruchéus dos templos e palácios, gradins e teias e nas mobílias de estilo.
Este exemplar, com 15,5cm de altura, é enformado por 6 bolbos integralmente revestidos a fio de seda. O primeiro a contar da copa, bem como o terceiro e o quinto, são adornados com ponto de rede de pesca. O terceiro, mais volumoso, além do ponto de rede, contém uma cintura de florinhas de pétalas abertas. Por cima do quinto bolbo aplicou-se uma flor de doze pétalas, seis grandes e seis de menor dimensão, que se podiam trazer abertas ou fechadas como se fora um botão de rosa.
A pega remata superiormente com flor aberta de dupla camada pétalas, cosida na horizontal. Detecta-se uma ligeira diferença de tonalidade entre a cor da pega (azul ferrete) e a do restante barrete (azul régio), certamente resultante do uso de ornatos pré-confeccionados na oficina da artesã. A flor superior encontra-se danificada por força do manuseamento a que o barrete esteve sujeito entre 1876 e 1907.
Além da função exibitória e da dimensão prática, a pega simboliza uma for emergente de uma cesta, munida de haste e diversas florinhas avulsas, a cesta dos frutos e flores de Minerva. Este elemento é atarraxado ao interior da copa do barrete com um parafuso. Trata-se de uma trabalho artesanal imaginativo e moroso, cujo processo de ornamentação é semelhante ao realizado no revestimento de uma maçaneta de borla de reposteiro.
A toda a volta do rebordo superior do barrete é exibida uma coroa de louros, ou galão ondulado, com vinte e quatro meios-círculos. Este ornato, que simboliza os louros dos heróis e vencedores, é uma herança pombalina, pois toda a iconografia anterior disponível não confirma a presença de tal solução, testemunhando antes os tufos e franjas directamente ligadas ao sopé da pega.
Imediatamente por baixo da laurea, e a toda a altura da ilharga, aplica-se uma franja torsa que antes do século XVIII era privilégio dos doutores de Leis. Por fora desta figuram vinte e quatro florinhas de seis pétalas abertas e corola, delas descaindo vinte e quatro pingentes de borlas, a toda a volta da ilharga do barrete. O esquema ornamental, de grande impacto visual, consiste no alinhamento vertical de uma flor aberta, cinco florinhas campaniformes, uma semente de romã forrada, uma florinha final e tufo. A ilharga do barrete fica totalmente coberta, descendo as vinte e quatro borlas para baixo do rebordo inferior.
No total: vinte e quatro florinhas abertas, vinte e quatro sementes, cento e vinte florinhas campaniformes e vinte e quatro tufos que não deixam de lembrar a flor do cardo, cuja semente era utilizada na transformação do leite.
As borlas dispostas na ilharga do barrete representam as flores e os frutos que a Sapiência faz resplandecer na cabeça dos que cultivam os estudos e o saber. As bolinhas revestidas remetem para a romã, considerada o manjar dos deuses na mitologia greco-romana e a união dos crentes perante a divindade[5].
Não é possível, passados mais de dois séculos, adivinhar o que terá levado as monjas bordadeiras e as artesãs das oficinas que se dedicavam a confeccionar prendas conventuais, mantos para santos, reposteiros, panos para exéquias, casacas fidalgas, bolsas de corporais, panos de altar, mitras, dalmáticas, estolas, insígnias doutorais e enxovais de noivas, a optar pelas flores e frutos em relevo. Objectos de luxo, a borla e capelo levavam bem uns dois meses até ficarem concluídos. Se o trabalho fosse intensivo, cerca de quinze dias. Salvo nos modelos onde se admitiam misturas de cores de ciências distintas, os trabalhos eram rigorosamente monocromáticos.
Este tipo de ornamentação começou primeiramente nas insígnias da Faculdade de Teologia, cujos lentes além de ocuparem posição de primazia na UC, eram muito ciosos da ostentação de vestes e insígnias que representassem o esplendor do saber e da religião. De Teologia passou às restantes escolas maiores, com opção definitiva após a Reforma Pombalina por um conjunto crescentemente padronizado: abandono do barrete doutoral quadrangular, consequente prevalência da tipologia redonda; triunfo da ornamentação rocaille.
Parecendo bizarras, a pega bolbosa e as borlas pendentes da copa do barrete doutoral conimbricense adquirem pleno sentido quando integradas no contexto da cultura palaciana que lhes deu origem (a cultura do palácio reitoral): afirmação pública do esplendor do saber, celebração festiva dos novos doutores, recepção a altos dignitários, participação em cerimónias palacianas, paradas pedestres e cavalgadas.
No Ocidente, a cobertura de cabeça de aparato que mais se aproxima da borla conimbricense é o galero verde dos prelados romanos e o galero escarlate dos cardeais. O último, com 30 borlas lançadas sobre o peito, era usado em audiências solenes, cavalgadas, investiduras e rituais fúnebres.
Ao primeiro impacto visual, o barrete doutoral assemelha-se a uma gigantesca borla de reposteiro ou baldaquino, daí o estranho nome que lhe concedeu a gíria conimbricense.
ANOTAÇÕES
[1] Erro devido ao grau de conhecimentos da artesã e do encomendador. Situação idêntica se pode observar quanto ao capelo do Prof. Doutor Joaquim Veríssimo Serrão. Fotografia em Jorge Custódio (coordenação), Património Monumental de Santarém, Santarém, Edição da Câmara Municipal de Santarém, 1996, p. 36.
[2] Visualize-se a fotografia publicada por Maria João Padez de Castro e Rui Figueiredo Marcos, Orações de Sapiência da Faculdade de Direito (1856-2005), Coimbra, IUC, 2007, p. 148.
[3] Joaquim Vieira, Marcello Caetano. Fotobiografias do século XX, Lisboa, Círculo de Leitores, 2002, p. 30.
[4] Podem visualizar-se diversos exemplares no Museu de Arte Sacra da Sé de Braga, Museu de Arte Sacra da Sé de Lisboa e secção sacra do Covento de Mafra.
[5] Sobre a simbologia das flores e frutos na religião católica e seu impacto na cultura popular, vide João Pedro Monteiro, “Simbólica”, in Colchas de Castelo Branco, 1993, pp. 105-118.

segunda-feira, 21 de dezembro de 2009


Capa de Bernardino Machado
Vista das costas.
MBM, VNFamalicão.


Capa de lente de Bernardino Machado
Modelo confeccionado em alfaitaria de Coimbra na década de 1890 em tecido de sarja à base de seis panos unidos nas costas e costurados diagonalmente da costura posterior para as bainhas dianteiras.
Trata-se de um modelo próprio para trabalho/uso quotidiano, em tecido de verão.
Vista de frente.
Acervo do MBM, VNFamalicão.


Capa de inverno
Distinta do ferraiolo (ou mantéu) em feitio e em corte é a capa cerimonial de inverno, peça da indumentária eclesiástica, burguesa, fidalga e académica, que em Portugal é mais conhecida por capote.
Em Portugal foi parte integrante da indumentária domingueira masculina provincial, assinalada em casamentos, baptizados e funerais.
Não possui mangas nem cabeção. A toda a volta do colarinho é cosida uma romeira ou capelo. O modelo "rico" português fecha na frente com alamares e tem o colarinho guarnecido de veludo. Em Itália, o capote é designado por "tabarro". A fotografia documenta o tipo veneziano setecentista com o corpo em seda preta lavrada, romeira de veludo com guarnições e fecho à base de alamares.
Nos meses de inverno o capote ou tabarro era o abafo mais usado pelos membros do clero. Quando confeccionado em vermelho, com guarnições douradas, o tabarro é privativo dos papas (que não usam o ferraiolo) e dos cardeais. Este tipo de agasalho chegou a usar-se na UC nos séculos XVI e XVII, tendo sido proibida por se constatar que os estudantes atiravam o capelo pela cabeça e se embuçavam para praticar pulhas e agressões.


Cerimónia de formatura no Boston College, Maio de 2009
Trecho do cortejo com o Cardeal Sean Ó'Malley, Arcebispo de Boston.


Grupo de magistrados (ministros) do Supremo Tribunal Federal do Brasil fotografados em 2006 com a capa de cerimónia/ferraiolo em cetim preto.


Capa de gala
Monsenhor Merry del Val, delegado papal no Canadá, fotografado em 1897 com batina talar, capelo romano (chapéu com cordão e borlas, também conhecido por saturno) e capa talar de cerimónia.
A capa talar, capa de honras, ferraiolo ou mantéu é uma peça de vestuário usada desde o século XVI por eclesiásticos, magistrados e altos dignitários académicos.
De acordo com o cerimonial romano, o ferraiolo de cor preta era comum a seminaristas, clero secular e clero regular. Os cadeais tinham o privilégio da seda moiré, na cor escarlate. Bispos, arcebispos e monselhores podiam usar o ferraiolo em seda púrpura.
O mesmo modelo, em cetim preto, foi usado pelos juizes do Supremo Tribunal de Justiça de Portugal e do Brasil, permanecendo o seu uso no Supremo Tribunal Federal do Brasil.
Com bainha pela meia perna, o ferraiolo ou mantéu era a capa de gala dos oficiais maiores e menores das câmaras municipais e tribunais, bem como dos vereadores e presidentes de câmara.
No século XVIII e na primeira metade do século XIX o ferraiolo foi usado na maior parte das comunidades rurais portuguesas como peça da indumentária domingueira feminina.
O mesmo modelo, com as características bandas peitorais e o cabeção foi também usado pelos lentes e estudantes da UC, sendo o dos escolares em tecido comum e o dos lentes em seda. Na actualidade é quase impossível avistar este tipo de capa na UC, embora haja docentes eclesiásticos detentores do modelo referido.