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sábado, 20 de junho de 2009


Estátua de Bissaya
Estátua de vulto de Fernando Bissaya Barreto (1886-1976). Trabalho da autoria do artista Vasco Berardo, foi implantado na rotunda fronteira ao Portugal dos Pequenitos em 2000.


Estátua de Jordão
Estátua de vulto em bronze do Doutor Levy Maria Jordão (1831-1875), da autoria do escultor António Duarte, existente no tribunal de Chaves.
Notável penalista e um dos pioneiros do sistema penitenciário, Levy diplomou-se na Faculdade de Direito da UC, instituição onde obteve a laurea doutoral em 19 de Junho de 1853. À semelhança de todos os doutorandos da época, possuía hábito talar e insígnias, fez a sua imposição de insígnias pouco depois do doutoramento administrativo, mas não chegou a integrar o corpo docente da UC.
Dito isto, a opção de António Duarte pelo hábito talar e capelo da Faculdade de Direito parece-nos francamente discutível. A falta de iconografia de apoio levou o escultor a figurar Levy com calça comprida e casaca, anacronismo inaceitável em 1853. Como se isto não bastasse, o trabalho figurativo sai deveras comprometido nos pormenores errados da carcela e das mangas.


O Brotero de Soares dos Reis
O Brotero de António Soares dos Reis, em mármore, moldado em 1883, e finalmente assente no Jardim Botânico da UC em 4.04.1887. Soares dos Reis utilizou no modelo em estúdio as vestes talares e as insígnias que lhe foram temporariamente emprestadas por Júlio Henriques. A figuração obedece às representações pictóricas multisseculares, com o retratado sentado e o barrete doutoral pousado em credência próxima ou no regaço.


Salazar togado
Fotografia da estátua de vulto de Oliveira Salazar que entre 1958-1974 esteve implantada no pátio interior do Palácio Foz, Lisboa. Trata-se de uma réplica do original feito por Francisco Franco para a exposição de Paris em 1937, com presença num dos pavilhões da Expo 1940.
Após o Brotero de Soares dos Reis, este Salazar é a segunda escultura de corpo inteiro que se conhece de um lente da UC em hábito talar e insígnias doutorais. Ao longo da sua carreira política, Oliveira Salazar deu a entender aos seus próximos e admiradores que nunca teria usado borla e capelo, pelo que as estátuas e retratos produzidos seriam apenas representações virtuais.
Trata-se de um embuste propagandístico baseado numa confusão surgida em 1951 quando se realizou em Coimbra um congresso da União Nacional. Com efeito, na data referida, a comissão organizadora pretendeu exibir um retrato de Salazar, trabalho que resultou de uma fotomontagem entre a cara de Salazar e os ombros de Marcello Caetano que se encontravam cobertos por capelo doutoral.
Nunca se explorou satisfatoriamente o motivo ou motivos que terão levado Oliveira Salazar a fingir que nunca teria usado ou possuído insígnias doutorais. A chave para a descodificação desta atitude pode radicar na seguinte explicação:
-o peso da tradição praxística conimbricense. Salazar não prestou provas doutorais escritas perante júri administrativo, mas sim concurso público para assistente em 1917, tendo sido proclamado em 1918 doutor pelos seus colegas de Faculdade, ao abrigo da legislação republicana da altura que possibilitava proclamar doutores. Por desrespeitar os direitos praxísticos exclusivos do reitor, esta situação era mal aceite na UC e entre os estudantes, correndo piadas sobre os "doutores ipso facto" ou "doutores de aviário". Salazar não fez imposção de insígnias, mas teve borla e capelo, aparecendo numa fotografia da primeira metade da década de 1920 com o capelo pelos ombros. Posteriormente, em 1925, Salazar comprou insígnias doutorais novas, informação que Franco Nogueira não se dá ao trabalho de ocultar.
Outro dado curioso sobre a relação de Oliveira Salazar com a UC e as suas tradições prende-se com o doutoramento honoris causa que lhe foi concedido pela Faculdade de Letras em 22.04.1959. Não consta ter havido cerimónia de imposição de insígnias e no velório ocorrido em Julho de 1970 o ditador foi vestido com as insígnias da Faculdade de Direito. Embora a situação nunca tenha sido questionada, ela desrespeita o protocolo conimbricense, pois a segui-lo conforme as disposições dos "Estatutos Velhos", a partir de 1959 Salazar ficava obrigado a usar insígnias doutorais com mistura de vermelho e azul-escuro.

sexta-feira, 19 de junho de 2009


Brotero
Apontamento do remate posterior da capa (Lx.)


Brotero
Estátua de vulto de Felix da Silva do Avelar Brotero (1744-1828). Doutorado em Medicina por Reims, foi integrado no corpo docente da Faculdade de Filosofia Natural da UC em 1791, atingindo jubilação em 1811. Usou a loba dos doutores e a borla e capelo em azul-escuro. Cientista de reputação internacional, prestou contributo notável ao Jardim Botânico da UC, e ulteriormente ao Jardim Botânico do Paço da Ajuda.
Como na década de 1880 já não sabia ao certo o que tinha sido a loba dos doutores, António Soares dos Reis modelou o Brotero destinado ao Jardim Botânico da UC com anacronismos vestimentários, situação que vemos repetida neste trabalho do escultor António Duarte, assente numa praceta do Parque de Monsanto, Lisboa, em 1984.
Os principais erros detectados são:
-na capa talar, a bainha posterior ligeiramente em godés, corte inaceitável na altura, por ser próprio dos capotes;
-ausência de cabeção e de estolas no mantéu ou ferraiolo, que ao tempo não tinha o corte geométrico e singelo que ora se conhece;
-ocorrência de sapatos comuns, quando só poderiam ser de couro preto e ornados de fivela de prata;
-figuração incorrecta da batina talar, ademais avistada sob a capa, que não era uma batina clerical romana mas sim uma loba de dois corpos, pelo que teriam de avistar-se a parte dianteira inferior do corpo interno e as abas da chamarra.


Júlio Henriques
Estátua de vulto em pedra, do imponente e patriarcal lente da Faculdade de Filosofia Natural (=Ciências Naturais) Júlio Augusto Henriques (1838-1928). Trabalho da autoria do escultor Barata Feyo, foi instalado no Jardim Botânico da UC em 1951.
Abordagem correcta do conjunto vestimentário e insigniário, numa época em que as insígnias doutorais da Fac. de Ciências eram em azul-escuro, por herança das disciplinas "científicas" da antiga Faculdade de Artes Liberais.
Botânico reputadíssimo e cientista a par de tudo quanto de mais fresco se estava a fazer nas universidades ocidentais, Júlio Henriques foi o "pai" do projecto que conduziu à estátua de Brotero assente no Jardim Botânico da UC e revelou ao longo da sua vida especial sensibilidade face ao associativismo cultural, filantrópico e científico. Assim, foi Vice-Presidente da Sociedade Internacional de Agricultura Colonial, Presidente da Sociedade Filantrópica - uma das muitas instituições conimbricenses pioneiras, neste caso a anteceder os serviços de acção social escolar - , e um dos sócios da primeira fornada da Associação Académica de Coimbra que, sendo bem mais velha do que se faz crer, entrou a funcionar continuadamente em Dezembro de 1861 e não apenas em Novembro de 1887. Ou seja, nem os lentes da UC eram tão cientificamente reaccionários e desactualizados com os estudantes da época fizeram questão de dar a entender, nem certas instituições culturais são tão recentes como por vezes se vai dizendo. Mas isto é outra questão que nos levaria aos atalhos da micro-história...


Egas Moniz
Estátua colossal de vulto de António Caetano de Abreu Freire Egas Moniz (1874-1955), antigo estudante e docente da UC que a partir de 1911 integrou o corpo docente da Faculdade de Medicina da UL.
Trabalho da autoria do escultor Euclides Vaz, foi assente em 1974 no terreiro fronteiro ao Hospital escolar da Santa Maria, em Lisboa. A obra encontra-se assinada e datada.
A indumentária docente da UC ressente-se de falta de rigor, lacuna que começa em 1883 quando António Soares dos Reis molda a maquete do Avelar Brotero destinado ao Jardim Botânico de Coimbra, e se prolonga pelo século XIX, atingindo uma dimensão de guarda-roupa hollyoodesco/fantasioso nos jurisconsultos do pórtico da Faculdade de Direito da UL (Almada Negreiros).
Doutorado em 14 de Julho de 1900, em Medicina, Egas Moniz usou as insígnias doutorais conimbricenses e o hábito talar de figurino laico-burguês em voga entre os lentes não eclesiásticos, conjunto indumentário e insigniário que passou a envergar na UL após a sua integração ocorrida a 1 de Abril de 1911.
Euclides Vaz, certamente por desconhecimento e falta de apoio iconográfico, opta por figurar Egas Moniz com batina talar, capa talar e borla e capelo. O erro radica justamente na abordagem da batina, pois na época em que Egas Moniz se doutorou e leccionou na UC apenas os lentes eclesiásticos continuavam a usar a batina comprida, estando então vulgarizada uma casaca preta embainhada pela meia-perna, pequeno uniforme a que após 1916 a UC concedeu o sortilégio de traje de gala.